sexta-feira, 29 de maio de 2009

Canção do dia de sempre



Tão bom viver dia a dia...
A vida assim, jamais cansa...

Viver tão só de momentos
Como estas nuvens no céu...

E só ganhar, toda a vida,
Inexperiência... esperança...

E a rosa louca dos ventos
Presa à copa do chapéu.

Nunca dês um nome a um rio:
Sempre é outro rio a passar.

Nada jamais continua,
Tudo vai recomeçar!

E sem nenhuma lembrança
Das outras vezes perdidas,
Atiro a rosa do sonho
Nas tuas mãos distraídas...

Mario Quintana

Cheio de vazio

O vazio é um meio de transporte
Pra quem tem coração cheio
Cheio de vazios que transbordam
Seus sentidos pelo meio
Meio que circunda o infinito
Tão bonito de tão feio
Feio que ensina e que termina
Começando outro passeio

E lá do outro lado do céu
Alguém derrama num papel
Novos poemas de amor

Amor é o nome que se dá
Quando se percebe o olhar alheio
Alheio a tudo que não for
Aquilo que está dentro do teu seio
Porque seio é o alimento
E ao mesmo tempo a fonte para o desbloqueio
E desbloqueio é quando aquele tal vazio
Se transforma em amor que veio

Paulinho Moska

quinta-feira, 28 de maio de 2009

As coisas mais leves

No fim tu hás de ver que as coisas mais leves são as únicas
que o vento não conseguiu levar:
um estribilho antigo
um carinho no momento preciso
o folhear de um livro de poemas
o cheiro que tinha um dia o próprio vento...

Mario Quintana

Meu segredo

É tão difícil falar e dizer coisas que não podem ser ditas. É tão silencioso.
Como traduzir o silêncio do encontro real entre nós dois? Dificílimo contar.
Olhei pra você fixamente por instantes. Tais momentos são meu segredo.
Houve o que se chama de comunhão perfeita. Eu chamo isto de estado agudo de felicidade.

Clarice Lispector

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Nunca ninguém sabe

Nunca ninguém sabe se estou louco para rir ou para chorar.
Por isso o meu verso tem esse quase imperceptível tremor...
A vida é louca, o mundo é triste:
Vale a pena matar-se por isso?
Nem por ninguém!
Só se deve morrer de puro amor...

Mário Quintana

terça-feira, 26 de maio de 2009

Ternura

Eu te peço perdão por te amar de repente
Embora o meu amor seja uma velha canção nos teus ouvidos
Das horas que passei à sombra dos teus gestos
Bebendo em tua boca o perfume dos sorrisos
Das noites que vivi acalentado
Pela graça indizível dos teus passos eternamente fugindo
Trago a doçura dos que aceitam melancolicamente.
E posso te dizer que o grande afeto que te deixo
Não traz o exaspero das lágrimas nem a fascinação das promessas
Nem as misteriosas palavras dos véus da alma...
É um sossego, uma unção, um transbordamento de carícias
E só te pede que te repouses quieta, muito quieta
E deixes que as mãos cálidas da noite encontrem sem fatalidade o olhar extático da aurora.

Vinícius de Moraes

Ainda que mal

Ainda que mal pergunte,
ainda que mal respondas;
ainda que mal te entenda,
ainda que mal repitas;
ainda que mal insista,
ainda que mal desculpes;
ainda que mal me exprima,
ainda que mal me julgues;
ainda que mal me mostre,
ainda que mal me vejas;
ainda que mal te encare,
ainda que mal te furtes;
ainda que mal te siga,
ainda que mal te voltes;
ainda que mal te ame,
ainda que mal o saibas;
ainda que mal te agarre,
ainda que mal te mates;
ainda assim te pergunto
e me queimando em teu seio,
me salvo e me dano: amo

Carlos Drummond

Eu queria trazer-te uns versos


Eu queria trazer-te uns versos muito lindos
colhidos no mais íntimo de mim...
Suas palavras
seriam as mais simples do mundo,
porém não sei que luz as iluminaria
que terias de fechar teus olhos para as ouvir...
Sim! Uma luz que viria de dentro delas,
como essa que acende inesperadas cores
nas lanternas chinesas de papel!
Trago-te palavras, apenas... e que estão escritas
do lado de fora do papel... Não sei, eu nunca soube o que dizer-te
e este poema vai morrendo, ardente e puro, ao vento
da Poesia...
como
uma pobre lanterna que incendiou!

Mario Quintana

Dialética

É claro que a vida é boa
E a alegria, a única indizível emoção
É claro que te acho linda
Em ti bendigo o amor das coisas simples
É claro que te amo
E tenho tudo para ser feliz

Mas acontece que eu sou triste...

Vinícius de Moraes

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Para se fazer uma canção

Para se fazer uma canção
Desfaço as malas do meu coração
Eu sobrevôo minha solidão
E encontro o fim de um deserto
Para se fazer uma canção
Um som, um céu sem direção
Como eu não previ, como eu nunca sei
O amor que dei
Acho a luz no fim da escuridão
E ascendo a imaginação
Olá, você ai
Que bom te ouvir
E eu não preciso de mais nada
Por isso corro nas calçadas, corro nos seus pensamentos
Alentos pra solidão
Passaporte pra dentro da alma
E você que vem com pressa, calma
Dor adeus, Deus perdão
Dois, amor, doeu?
Mas como é bom! Mas como é bom!
E quando é bom é tudo seu
E eu sou teu, você e eu
Na imensidão a sós
Essa é minha voz
Que é a sua voz também
E a canção é de ninguém

Paulinho Moska

Parte Coração

Parte Coração
Aprende que tua missão nessa vida é sofrer
Pobre coração
Dói no fundo do peito
Dizendo que existe
Mostrando que insiste em sofrer, em sofrer

Chore e bate mais forte
e as vezes mais manso
que eu mesmo não canso
de me apaixonar

bata e se dê o direito de gostar de alguém
que eu dou um jeito de gostar também
sou teu companheiro até no sofrer
mas vê se de vez em quando, em vez de chorar
você ri um pouco que é pra compensar
toda essa tristeza que é de nós dois

Pedro Luís